O CABELO DE MINHA FILHA É LINDO! NÃO É UM NINHO!
Hoje, ao chegar da escola, minha filha de 5 anos, compartilhou comigo, animada, que teve uma atividade com um “homem do bombeiro” na escola. Segundo ela, o bombeiro falou sobre uma possível visita da turma ao quartel dos bombeiros e contou que os alunos poderiam ter uma experiência direta com animais, entre eles, uma cobra.
Durante a explicação, o bombeiro teria olhado diretamente para minha filha que usa uma bandana de cor laranja e o cabelo com um belo penteado black power , e dito que colocaria a cobra “no cabelo dela”. Ela contou isso rindo, sem entender totalmente o peso da fala. Mas, como pai, senti imediatamente o incômodo.
Respirei fundo e iniciei um diálogo com minha filha, com todo o carinho e responsabilidade que carrego como pai e como homem negro. Expliquei a ela que a fala do bombeiro, embora disfarçada de brincadeira, foi racista. Fazer associação direta entre seu cabelo, símbolo de identidade, resistência e beleza com um ninho de cobras não é algo inocente.
Expliquei que o cabelo black já foi historicamente alvo de piadas, preconceito e desvalorização, e é justamente por isso que precisamos estar atentos a essas atitudes, mesmo quando parecem brincadeiras. Eu e sua mãe já a ensinamos que o nosso cabelo é poderoso, bonito e que deve ser respeitado, e isso faz com que ela se sinta bem, com seus cachos.
Esse é o terceiro episódio racista, preconceituoso que convivo desde janeiro até hoje, julho de 2025. No início do ano no aeroporto de Salvador (BA) em um grupo de seis pessoas SÓ EU fui convidado para averiguação dos pertences.
Quatro meses depois, dois policiais abordaram EU E UM COLEGA de trabalho, que voltávamos para casa e ao perguntarem nossas profissões não acreditaram que trabalhamos defendendo os direitos humanos e fizeram chacotas, dizendo até que matariam uma pessoa para trabalhar onde nós trabalhamos.
Com essa agora dá uma média de um ato racista a cada dois meses só comigo e os meus, seja involuntário, premeditado, espontâneo seja como e onde for o racismo existe e não adianta tapar o sol com a peneira.
Mais do que isso, decidi que essa situação não ficará impune enquanto, por respeito à minha filha e a outras crianças negras que podem ter passado ou passar por situações semelhantes, devo comunicar à escola o ocorrido e também trazer a tona este texto para que nós pais e mães negros fiquemos atentos. É fundamental que o ambiente escolar assim como o direito de ir e vir seja um espaço seguro e acolhedor para todas as crianças, e que os profissionais que entram nesse ambiente estejam preparados para lidar com as diversidades sociais e culturais com respeito e consciência.
Por Cidicleiton Luiz, pai revoltado, educador social, comunicador popular e integrante do Coletivo Força Tururu
Comentários
Postar um comentário